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Quarta jornada reFloresta

Ao chegar em Anã, fomos recebidos com afeto sincero, acolhimento genuíno e olhares que convidavam à escuta e à presença. Logo no início da vivência, Dona Odila - grande liderança da comunidade - compartilhou sua história, suas memórias e emoções. Em suas palavras se entrelaçaram sorrisos e dores, experiências e silêncios que fizeram brotar reflexões sobre privilégios e desigualdades. Escutar Dona Odila foi um convite para abrir o coração, não apenas os ouvidos.

A travessia até Anã, pelas águas do Tapajós e do Arapiuns, já carregava em si a dimensão simbólica da chegada. Para muitos, atravessar o rio era também atravessar fronteiras internas. O céu, a floresta e o rio compunham um cenário que, mais do que paisagem, se tornava uma experiência sensorial e espiritual. Aquilo despertava encantamento nos olhos de quem chegava. E nesse encantamento compartilhado, todos reaprendiam a ver, a sentir, a admirar.

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Puxirum

Durante essa jornada, um sonho antigo da comunidade se tornou realidade. Desde a 3ª Jornada, já se sonhava com a construção de uma pracinha, e foi através do puxirum que esse sonho se concretizou. O mutirão mobilizou voluntários e moradores em um gesto coletivo de cuidado, união e presença. Mais do que brinquedos e estruturas, a pracinha simbolizou um espaço de vida, encontro e continuidade entre gerações.

Enquanto a madeira da gangorra era fincada e os balanços ganhavam forma, filas de crianças já se formavam para experimentar a novidade. Mal os brinquedos estavam prontos e já estavam em uso. Ver a praça sendo habitada no mesmo dia em que era construída foi um lembrete do poder das pequenas grandes realizações. A alegria era imediata, intensa e compartilhada.

O puxirum foi mais do que uma força de trabalho. Foi um ato de pertencimento. Ali, cada um contribuía com o que sabia, aprendia o que não sabia e compreendia que estar junto não é se anular, mas se fortalecer. O saber circulava, a escuta era horizontal, e o fazer junto era carregado de afeto. Aprender a trançar a palha para fazer o telhado foi também aprender a entrelaçar relações, a restaurar vínculos, a cuidar da terra como extensão do próprio corpo.

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Aprendizados

Ao longo da jornada, os participantes mergulharam nas práticas e nos modos de vida da comunidade. Aprenderam com Seu Audair sobre o território, com Leandro sobre o cotidiano do trabalho, com Dona Neuza sobre a organização coletiva, com Eliza sobre a resistência e o ativismo, com Luciano sobre o turismo comunitário, com Seu Danilo sobre o teatro e a memória viva da cultura local, com Dona Nara sobre os cuidados diários e a força das mulheres da floresta.

Entenderam que Anã não é só um lugar cercado de rios e árvores, mas um território de luta, sabedoria e sobrevivência. Que a floresta em pé é sustentada pelas mãos e pelos saberes daqueles que nela vivem e a defendem. E que o turismo, a piscicultura, a meliponicultura e tantas outras práticas fazem parte de um projeto coletivo de permanência e dignidade.

As noites em Anã revelaram a força da cultura. A Noite Cultural foi um marco, com crianças dançando carimbó, encenações teatrais, concursos de piadas e muitos risos. O brilho nos olhos dos moradores e visitantes era reflexo daquilo que se constrói em comunidade. Em meio à simplicidade material, emergia uma abundância de afetos, saberes e vínculos. Ali, numa comunidade pequena e distante dos centros urbanos, resplandecia uma riqueza rara: a riqueza da vida compartilhada.

A experiência em Anã permitiu reencontrar encantamentos há muito adormecidos. Colher manga do pé, descansar na rede sob o brilho da lua, ouvir histórias embaladas pelo vento. Corpo e território deixavam de ser conceitos distintos e se tornavam parte de um mesmo todo. Viver, ali, era muito mais do que sobreviver. Era sentir com intensidade, era estar por inteiro.

E quando chegou o momento da despedida, as águas do Arapiuns acolheram as emoções transbordadas. A saudade se anunciava nos abraços e nos olhares demorados. Despedia-se não apenas de um lugar, mas de pessoas que marcaram a jornada com sua generosidade e sua força. Ficava a certeza de que, sob a floresta, tem gente. Gente que sonha, que resiste, que ensina, que cuida.

A 4ª Jornada encerrou-se como um ciclo de trocas verdadeiras, de aprendizados profundos e de pertencimento restaurado. Um lembrete de que a Amazônia pulsa através das pessoas que a habitam. E que, ao partir, quem esteve ali nunca mais será o mesmo.

Durante a jornada, nasceu um poema coletivo que ajudou a traduzir, em palavras sensíveis, o que se viveu em Anã. Em um trecho, lia-se: "Muanã foi pai e mãe, serpente do amanhecer, lampião da noite e criança travessa. Muanã me fez chorar. Muanã gestou floresta, contração de vida, e pariu o mar do rio Arapiuns, pariu gente, pariu arte. Muanã me fez sorrir e respirou o surgimento de Anã." Produzido por Panassol a partir das vivências do grupo, o poema simbolizou o espírito do território e a experiência de renascimento que cada pessoa carregou ao voltar para casa.

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